Mudança no artigo 115 da Lei 6404: a “russificação” do nosso mercado de capitais.



A 1ª vez que me deparei com esse termo foi em abril de 2013, em um evento promovido pela AMEC: investidores estrangeiros viam a ameaça do nosso país passar por uma “russificação”, ou seja, transformar-se num mercado no qual a percepção externa – correta ou não – é de pouco apreço pelas regras de mercado e fair play (leia mais em https://www.amecbrasil.org.br/o-imperador-de-todos-os-males/).

Passado o tempo fico com a impressão de que a ameaça está se concretizando.

Primeiro veio a CVM equiparando os presidentes de assembleias a garçons: contribuem para o bom andamento dos trabalhos do conclave, mas não podem ser julgados por seus atos. Vivem à custa do mercado de capitais, mas não podem ser julgados pelos atos praticados no serviço mais caro que prestam – presidir uma assembleia geral. Ilegitimidade ativa da CVM para julgar “demais participantes do mercado”? Que rasguem a Lei 6385 (art. 9º - V).
  
Ops, mas o presidente da assembleia aceitou o voto de empresa ligada ao acionista controlador na eleição em separado para o conselho fiscal? Foi mal, reclamem com o bispo. Ops, derrubou café no terno italiano do presidente do conselho de administração, que covardemente participou da assembleia, mas não presidiu a reunião? Foi mal, limpa com jornal. Porteira aberta para todo tipo de mal feito.

Vale registrar o voto contrário do diretor Gustavo Borba nesse julgamento, que afirmou: “o presidente da assembleia exerce uma função que, apesar de predominantemente burocrática, possui relevância estratégica para o funcionamento correto da assembleia, especialmente quanto ao exercício do direito dos acionistas”. Frisou ainda que “suas decisões não estão submetidas à revisão por nenhum outro órgão superior da companhia”. E concluiu: “funções do presidente da mesa são exercidas no âmbito da Assembleia Geral, órgão essencial e superior da companhia, sem o qual esta não pode sequer funcionar. Nesse contexto, o presidente da mesa desempenha função extremamente sensível, visto que conduz os trabalhos do órgão em que todos os acionistas podem se manifestar e exercer seus direitos, estando, por conseguinte, sujeito a diversas pressões e dificuldades”. Não precisa escrever mais nada (relembre o processo no link http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/noticias/anexos/2018/20180220_Voto_DHM_Cia_Participacoes_Alianca_da_Bahia.pdf).

E agora vem o nosso brilhante poder legislativo e propõe “liberar geral” o voto dos acionistas controladores em situações de conflito de interesse.

A alegação apresentada por alguns ilustres advogados entusiastas dessa linha chega a ser risível: sem essa “liberação” teríamos o outro extremo, a chamada “ditadura da minoria”... Isso mesmo, minoritários malvados, com apenas 5% de ações, poderiam tomar de assalto a Cia, movendo ações infundadas de responsabilidade contra administradores, por exemplo. Desafio qualquer um a me apresentar um único caso desses. Pode mandar por e-mail que eu publico na sessão de comentários.

Não gostou de uma votação com acionista controlador em conflito de interesse? Vai recorrer na nossa célere Justiça. Mas não esqueça que a fatura de honorários galácticos a ser paga ao advogado-figurão presidente da assembleia é improrrogável, vence dia 5. E não adianta reclamar com o Putin.

E já que as chances de um título brasileiro do Glorioso são cada vez mais remotas, agora é foco total no artigo 115 !!!

Abraços a todos,
Renato Chaves


P.S.: a pressão deve continuar até a votação definitiva da matéria, não dá para confiar em promessas ... o IBGC já publicou uma carta contra a famigerada mudança (veja no link https://www.ibgc.org.br/blog/artigo115). A AMEC também (veja no link https://www.amecbrasil.org.br/manifestacoes/cartas-do-presidente/).

Comentários

Postagens mais visitadas