Mercado de capitais desnudo: todo crime poderá ser perdoado.
Desculpem
a insistência no tema, mas chega a ser escandaloso.
Recente
caso apreciado pelo colegiado da CVM, com proposta de termo de compromisso
recusada, pode levar o distraído leitor a achar que finalmente o quesito
gravidade do delito está sendo levado em conta quando da análise desse tipo de “acordo”.
Ledo engano.
No
processo em questão o criminoso de colarinho branco foi acusado de manipulação
do preço de diversos ativos, por meio da inserção de ofertas artificiais no
livro de negociação em 21.934 oportunidades (!!!), o que gerou um benefício
financeiro para o investidor no valor de R$ 1,550 milhão !!!
Não é
erro de digitação: mais de 21.000 “eventos” em 4 diferentes corretoras, com a
seguinte estratégia (conhecida como layering), segundo acusação da área
técnica da Autarquia:
a) Criação de falsa liquidez – o
investidor-trombadinha inseria ofertas artificiais do lado oposto ao do
posicionamento, que formam camadas de oferta sem propósito de fechar negócio e
alteram o spread do livro de ofertas, com intenção de atrair investidores para
incluir ou melhorar suas ofertas;
b) Posicionamento – o
"investidor" registrava ofertas de compra ou venda que desejava executar
em um lado do livro, antes ou após a criação da falsa liquidez;
c) Execução do negócio – a oferta
inicial de compra ou venda do "investidor" era executada na sequência
com oferta que foi influenciada pela falsa liquidez; e
d) Cancelamento – após a realização dos
negócios, as ofertas artificiais eram canceladas.
Diante
de tão ardilosa trama, com requinte de bandidismo rasteiro/faroeste caboclo,
podemos imaginar que qualquer proposta de termo de compromisso seria
sumariamente recusada, já que diante da regra vigente a apreciação de proposta
de TC pela CVM deve sempre levar em consideração a oportunidade e a
conveniência na celebração do compromisso, a natureza e a gravidade das
infrações objeto do processo, os antecedentes dos acusados e a efetiva
possibilidade de punição. Que nada, a recusa se deu tão somente pelo valor da
oferta, considerada irrisória pelo Comitê que negocia com meliantes.
Pois
é, prova maior de que ferramenta já é tratada pelo mercado com desrespeito, o
meliante teve a petulância de oferecer R$ 20 mil, em suaves prestações, 20
parcelas iguais e sucessivas, estilo carnê Casas Bahia.
Diante
da “veemente” recusa da CVM, o meliante propôs então R$ 25 mil no mesmo padrão
Casas Bahia, em parcelas mensais, iguais e sucessivas. Se tivesse proposto o
mesmo valor do benefício financeiro (R$ 1,550 milhão), provavelmente estaria
perdoado, sem confissão de culpa, com o Tio Patinhas de Brasília sorrindo à
toa.
Se o
meliante em questão fosse estudioso, lendo processos sancionadores antigos, saberia que
até o trio-parada-dura, aquele das cervejas e ketchup*, já se livrou de uma
punição exemplar ao assinar um milionário
termo-de-compromisso-sem-confissão-de-culpa: ofereceram R$ 3 milhões na 1ª
rodada de negociações, não colou, ofereceram R$ 15 milhões e ficou tudo bem. E
tome cerveja de milho.
Resumindo
poeticamente:
No
mercado de capitais não tem crime sem perdão,
Estuprou,
matou, esquartejou?
Não
importa a acusação,
o TC é
uma solução.
Quer
pagar quanto meu irmão?
Aí vai
uma sugestão:
2,5x o
valor da transação,
e tá tudo
limpo, com muito dinheiro, água e sabão.
Abraços a todos,
Renato Chaves
* Nota da redação: não existe pizza
ruim nesse mundo, você que colocou pouco ketchup.
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