Caso WIZ: o controlador oculto.

 

Primeira de uma série de postagens com casos julgados pelo Colegiado da CVM com o “atropelamento” da área técnica (disponível no link https://conteudo.cvm.gov.br/decisoes/2018/20180904_R1/20180904_D0975.html)

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RECURSO CONTRA ENTENDIMENTO DA SEP – CARACTERIZAÇÃO COMO ACIONISTA CONTROLADORA DIRETA DA CAIXA SEGUROS HOLDING S.A. E INDIRETA DA WIZ SOLUÇÕES E CORRETAGEM DE SEGUROS S.A. – CAIXA SEGURIDADE S.A. – PROC. SEI 19957.009575/2017-73

Reg. nº 0975/18
Relator: DPR

Trata-se de recurso apresentado por Caixa Seguridade S.A. (“Caixa Seguridade”) em face do entendimento manifestado pela Superintendência de Relações com Empresas (“SEP”) no Relatório de Análise n.º 138/2017 (“RA 138”) quanto à caracterização da Caixa Seguridade como integrante do bloco de controle da Caixa Seguros Holding S.A. (“CSH”), em conjunto com a CNP Assurances S.A. (“CNP”) e, consequentemente, como acionista controladora indireta da Wiz Soluções e Corretagem de Seguros S.A. (“Wiz” ou “Companhia”). 

A Companhia é controlada em conjunto pela CSH e pela Integra Participações S.A. (“Integra”, controlada pela Federação Nacional das Associações de Pessoal da Caixa Econômica Federal – “FENAE”), as quais são signatárias de acordo de acionistas celebrado no âmbito da Wiz (“Acordo de Acionistas Wiz”). Por sua vez, a CSH possui como principais acionistas a Caixa Seguridade e a CNP, as quais detêm, respectivamente, 48,21% e 51,75% do capital total e votante da CSH, signatários de acordo de acionista (“Acordo de Acionistas CSH”). 

Além de sua participação na Wiz, a CSH controla a Caixa Seguradora S.A. (“Seguradora”), por meio de sua subsidiária integral, Caixa Seguros Participações Securitárias Ltda. (“Holding Susep”). A Seguradora celebrou com a Caixa Econômica Federal - CEF, em 2.10.2006, contrato por meio do qual lhe foi conferida exclusividade para venda de seguros e outros produtos nos canais de distribuição da CEF (“Contrato Operacional”), e que possui vigência até 2021. 

Adicionalmente, por meio do Acordo de Acionistas Wiz, foi conferido à Wiz direito de exclusividade para a intermediação dos produtos da Seguradora nos canais de distribuição da CEF, enquanto vigente a parceria comercial entre a CEF e as controladas da CSH formalizada no Contrato Operacional. 

Em 10.8.2017, a Caixa Seguridade anunciou por meio de fato relevante que teria decidido encerrar em 2021 o acordo que disciplina o acesso exclusivo da CSH e de suas controladas à rede de distribuição da CEF. Na sequencia, em novo fato relevante publicado em 28.09.2017, a Caixa Seguridade informou que firmou um memorando de entendimentos não vinculante com a CNP envolvendo a potencial formação de uma nova joint venture para exploração conjunta de alguns ramos de seguro, com exclusividade, na rede de distribuição da CEF. 

Nesse contexto, integrante do conselho de administração da Wiz apresentou à Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) expediente por meio do qual solicitou a divulgação do conteúdo do Acordo de Acionistas CSH pelos acionistas controladores da Companhia. 

A partir das discussões travadas no âmbito de referido expediente, surgiu a controvérsia objeto deste processo, qual seja a configuração do controle acionário da Wiz, uma vez que esta definição passou a ter implicações relevantes, especialmente para efeito de eventual caracterização de abuso de poder de controle em razão dos eventos noticiados por meio dos fatos relevantes acima referidos. 

Assim, com o objetivo de apurar essa questão, a SEP analisou, entre outros elementos, a estrutura do controle societário da Wiz e o Acordo de Acionistas CSH, tendo concluído com base nos fundamentos expostos no RA 138 que a Caixa Seguridade e a CNP “agem como um bloco, representando um mesmo interesse” e que a Caixa Seguridade seria, portanto, nos termos do art. 116 da Lei 6.404/76, acionista controladora da CSH e, por extensão, da Wiz.

A Caixa Seguridade apresentou recurso ao Colegiado contra o entendimento da SEP, por meio do qual sustentou, em síntese, que: (i) o controle da CSH era detido e exercido exclusivamente pela CNP, uma vez que era esta acionista quem nomeava a maioria dos membros do conselho de administração (6 dos 10 membros) e todos os diretores da CSH e de suas controladas, inclusive da Wiz; e (ii) que os direitos que lhe são conferidos por força do Acordo de Acionistas CSH seriam não apenas típicos de um acordo de proteção de minoria, como também negativamente desproporcionais à relevância do investimento por ela detido. 

Ao analisar o recurso apresentado, o Diretor Pablo Renteria asseverou que, nos termos do art. 116, caput, e do art. 243, § 2º, para determinar se uma sociedade é controladora de outra, é necessário demonstrar que dita sociedade é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, (i) a preponderância nas deliberações sociais e, cumulativamente, (ii) o poder de eleger a maioria dos administradores. 

Em seu entedimento, a Caixa Seguridade somente poderia ser reputada controladora (conjunta) da CSH caso as disposições estipuladas no Acordo de Acionistas CSH tivessem conduzido a CNP a compartilhar as prerrogativas políticas que, a princípio, caberiam apenas a ela, na qualidade de acionista majoritário – o que não teria se verificado no presente caso. 

No que concerne às matérias de competência da assembleia geral, o Diretor Pablo Renteria manifestou seu entendimento de que a leitura do Acordo de Acionistas CSH o levava a concluir, da mesma forma que a SEP, que a CNP repartiu com a Caixa Seguridade o poder de preponderar nas deliberações assembleares da CSH. 

Por outro lado, tendo em vista que o Acordo de Acionistas CSH estipula que, dos membros que compõem o conselho de administração da CSH, 6 são indicados pela CNP, enquanto os outros 4 são indicados pela Caixa Seguridade, era possível concluir que o referido acordo não levou a CNP a abrir mão do poder de eleger, por si só, a maioria dos conselheiros da CSH, e como tal prerrogativa não foi partilhada com a Caixa Seguridade, esta não poderia ser considerada sociedade controladora da CSH. Ponderou, no entanto, que caso o Acordo de Acionistas CSH previsse quórum qualificado para a aprovação de todas ou de parte substancial das matérias de competência do conselho de administração, o poder de eleger a maioria dos conselheiros perderia em relevância, uma vez que o funcionamento do conselho de administração dependeria, necessariamente, da ação concertada dos conselheiros nomeados pelos diferentes acionistas. 

No entanto, a análise das matérias de competência do conselho de administração cuja aprovação requer o voto favorável de, no mínimo, 8 membros – e, por consequência, dependeria da concordância dos conselheiros indicados pela Caixa Seguridade – revela que várias matérias relevantes escapam ao quórum qualificado, sujeitando-se, em vez disso, ao poder de mando da maioria dos conselheiros indicados pela CNP. 

Nesse sentido, o Relator acatou o argumento de que as matérias de competência do conselho de administração da CSH previstas no Acordo de Acionistas CSH que dependem da concordância dos conselheiros indicados pela Caixa Seguridade (i) constituem proteções recebidas pela Caixa Seguridade em contrapartida à autorização conferida à CNP para gerir a comercialização de produtos da marca Caixa nos canais de distribuição da CEF e (ii) se destinaria a assegurar a estabilidade das bases contratuais da parceria comercial, mas não conferiria, por si só, à Caixa Seguridade poder de mando sobre a condução dos negócios sociais da CSH e de suas controladas. 

Desse modo, e considerando que cabe exclusivamente à CNP eleger a maioria dos conselheiros da sociedade, seria mais acertado considerar a Caixa Seguridade como uma acionista relevante da CSH, que exerce influência significativa no âmbito dessa sociedade e de suas controladas, mas que não partilha com a CNP o exercício do controle acionário. 

Por fim, o Diretor Pablo Renteria examinou se, apesar de não ser controladora direta da CSH, a Caixa Seguridade dispunha contratualmente de poderes tais sobre o exercício do controle acionário da Wiz que a conduziriam à condição de controladora indireta desta última; tendo concluído, ao final, que não seria o caso. 

Por todo o exposto, votou pelo provimento do recurso e a consequente reforma do entendimento da SEP para que fique reconhecido que a Caixa Seguridade não é acionista controladora da CSH em conjunto com a CNP e tampouco controladora indireta da Wiz.

Por unanimidade, acompanhando o voto do Relator, o Colegiado deliberou pelo provimento do recurso apresentado.

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Abraços fraternos,

Renato Chaves

Comentários

  1. Governo enganando o governo? Ou o risco é calculado?

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    1. Confesso que não entendi o comentário sr. Anônimo. A empresa não tinha sócios "privados"?

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