Relacionamento entre investidores e conselheiros: remando contra a maré.
Nove entre dez agentes que discutem tópicos de Governança Corporativa no
Brasil apoiam a ideia de maior interação entre conselheiros de administração e
investidores. Pelo jeito sou o único na contramão.
Tarefa árdua ser contra, eu reconheço. Apresento a seguir meus argumentos na forma de provocações, como já é praxe aqui no Blog da Governança:
- Quem o
conselho irá atender? Quem detiver 2%, 1% das ações? Somente “acionistas de referência”?
A CVM irá criar uma regra para identificar tais “acionistas de referência”? O
botafoguense Renato, detentor de 8 ações da empresa que cobra pedágio e paga
propina, também poderá solicitar uma "audiência" (8 ações equivalem a
aproximadamente 0,0000004% do capital social)? Em caso de excesso de
solicitações, o conselho seguirá a ordem de protocolo dos pedidos ou o irá
privilegiar o representante do fundo de pensão dos professores do Arkansas,
devido à sua visibilidade para o mercado?
- Como vai funcionar
a dinâmica dessa “audiência”? O investidor terá que submeter suas perguntas
previamente para avaliação do DRI e advogados (sempre eles...), ou será no
esquema Roda Viva? Os assuntos tratados serão compartilhados com os demais
acionistas? Os encontros serão gravados para a apuração de eventual
compartilhamento indevido de informações reservadas? A gravação será
compartilhada com o grande público? O investidor poderá escolher o conselheiro
a ser entrevistado?
- Perguntas
"inconvenientes" serão aceitas, ou só valerão perguntas “fofas”, "bem
comportadas"? Por exemplo, eu gostaria de perguntar ao presidente do
conselho da empresa que corrompeu inúmeros agentes públicos sobre procedimentos
de gestão de riscos, já que os executivos montaram um robusto esquema de
corrupção com as moedinhas arrecadadas (tão robusto que a delação premiada
envolve dezenas de “profissionais” e o assunto virou ressalva de auditor
externo – caso único entre as empresas do Ibovespa);
- Os
investidores que participarem de uma “audiência especial” serão monitorados
pela CVM para identificação de eventuais casos de oscilação atípica de preços?
Ou o “investidor-entrevistador” ficará impedido de negociar papéis por um
período após o encontro reservado?
Aceito o argumento de que o legítimo interesse das turmas do Leblon, NY
e Faria Lima não é a obtenção de informações reservadas/diferenciadas, mas sim
avaliar a qualidade dos conselheiros. Em uma conversa de 1h será possível
distinguir o conselheiro ativo, até contestador, do conselheiro “boa-praça”,
que entra mudo e sai calado das reuniões para não colocar o cargo em risco? Ok,
avaliou um conselheiro, mas e os outros sete, nove, dez conselheiros? Pra que
serve essa conversa mesmo então?
Como sabemos que nenhum investidor constrói sua “tese de investimento”
em uma grande empresa somente lendo DFs e formulários de referência, muito
menos ouvindo o discurso pasteurizado dos DRIs, fica claro que esses
investidores estão procurando alcaparras para colocar no “molho” da análise.
Já que o interesse genuíno de todos parece ser avaliar a atuação dos
conselhos sugiro que as avaliações de todos os órgãos de GC se tornem
obrigatórias, feitas preferencialmente por agentes externos, com a divulgação
pública dos relatórios finais. Parece mais razoável, pois dessa forma a visão
do todo seria compartilhada com os acionistas sem exceção e não somente para
meia dúzia de privilegiados, permitindo-se inclusive que o conjunto dos acionistas troque conselheiros mal avaliados
nas assembleias.
Além de relatórios de avaliação públicos, poderíamos, para atingir o
estado da arte, copiar Warren Buffett e reservar um espaço nas assembleias para
os conselheiros responderem perguntas dos acionistas. Afinal, quem não deve não
teme, diz o ditado.
Abraços fraternos,
Renato
Chaves
Acho que a mesma lógica se aplica aos eventos pré-IPO. Investidores institucionais tem acesso a informações totalmente diferente do investidor de varejo. Deveria haver regra exigindo a gravação e divulgação destes encontros.
ResponderExcluirCaro Renato, concordo com sua preocupação. Acrescento mais um aspecto do risco dessa inciativa: Daria a cada conselheiro um poder de informação "autorizada" sobre a empresa contra os interesses dos investidores. Por exemplo, se a conversa "autorizada"de uma opinião minoritária de um conselheiro (muito comum na vida de uma empresa) afetar os preços de mercado da ação da empresa, quem vai se responsabilizar pelos possíveis prejuízos/ganhos dos investidores com a mudança de valor de mercado da empresa? Enfim, ao invés de transparência, isso tenderia, na minha opinião, a trazer volatilidade indesejável aos preços das ações, contra os interesses dos investidores. Abraço. Ricardo Malavazi
ResponderExcluirPrezados Bruno e Malavazi, vale lembrar que a CVM permite a utilização de sala de bate-papo (chat) e ninguém usa. Está lá no item 12.2.j do Formulário de Referência. Um forte abraço.
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