Ativismo societário ou postura colaborativa? Que tal um ativismo participativo?

A matéria publicada na Revista Capital Aberto de janeiro/2011, sob o título “Tribo alternativa”, nos leva a refletir sobre como anda o nosso mercado de capitais, especialmente após anos de disseminação das boas práticas de governança corporativa, tanto nas empresas “veteranas” como nas novatas, além dos enormes avanços na regulação.

O termo “ativismo societário”, talvez por nos remeter ao tempo em que muitas empresas captavam recursos já com a fórmula pronta para subtrair direitos dos acionistas não controladores na assembleia seguinte, ganha muitas vezes uma conotação negativa nos dias de hoje: seria o acionista chato, que tem um espírito questionador, às vezes sendo tachado de encrenqueiro na busca de supostos direitos usurpados. Um investidor que escreve mais cartas para a CVM do que faz/analisa estudos sobre os fundamentos da empresa investida.

Muita calma nessa hora: existem sim investidores que fazem barulho, questionam situações, sem que os demais investidores consigam enxergar qual o real interesse do “valentão”. Será que ele está usando ações alugadas? Será que esse investidor, que veste a capa de “bastião da moralidade”, não está atuando dessa forma porque assumiu posições diversas, mediante a emissão de opções de compra e/ou venda?

Por outro lado, infelizmente as “pegadinhas” em estatutos e nas informações vazias de algumas empresas ainda existem e sugerem que o investidor deve manter uma postura atenta. Isso vale especialmente para aqueles investidores que entram em investimentos sem uma análise mais aprofundada, só olhando o preço da ação no momento e seu potencial de ganho (quanto mais rápido melhor). Como sou formado na escola da análise fundamentalista, concordo com o conceito dos nossos amigos Damasceno e Orenstein: acredito piamente que os investidores que adotam a análise fundamentalista dificilmente serão surpreendidos por “pegadinhas”.

Mas prefiro ficar num meio termo: seria um “ativismo participativo”, onde o investidor interage constantemente com a Administração e é respeitado por conta do seu conhecimento e contribuições, mas mantém a chamada “eterna vigilância”. Isso porque as estruturas piramidais complexas de controle, holdings não operacionais sediadas em paraísos fiscais, ações PN e tantas outras arquiteturas jurídicas criativas, que por vezes terminam em usurpação de direitos, ainda existem por aí.

Comentários

  1. Caro Renato,
    Que bela e ponderada análise. O ativismo, nada mais é, a meu ver, o que está delineado no Art. 153 da Lei das S.A. O agente de Governança "deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e "probo" (grifo) costuma empregar na administração dos seus próprios negócios". O saudoso e sábio Peter Drucker, em magistral artigo para o livro "As cinco perguntas essenciais que você sempre deverá fazer sobre sua empresa" nos brinda com estas pérolas: (i) Se o consenso sobre um assunto importante for rápido demais, não tome a decisão precipitadamente; (ii)unanimidade significa que ninguém fez o dever de casa; (iii) as decisões da organização são importantes e arriscadas, e elas devem ser controversas; (iv) instituições sem fins lucrativos precisam de uma atmosfera saudável para a divergência se desejam fomentar a inovação e o comprometimento. Elas devem incentivar a discordância franca e construiva justamente porque todos estão comprometidos com uma boa causa; (v) sem o devido incentivo, as pessoas tendem a evitar discussões, difíceis mas vitais, ou transforma-nas em feudos secretos; (vi) outro motivo para incentivar a divergência é que qualquer organização precisa de um inconformista.
    Grande abraço,
    Wilton Daher

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  2. Paulo Rogério Lima17/02/2011, 10:37

    Caro Renato:

    Mais uma vez, quero parabenizá-lo pela abordagem clara e questionadora sobre este tem. Bom, como estudioso da Governança Corporativa, sempre vejo com bons olhos o chamado ativismo societário. É evidente que existem acionistas com expectativas e desejos bem diferentes. Isso é característica da própria raça humana. Se você pega um investidor institucional focado na alta frequencia e em ganhos de curto prazo, a sua ideologia de investimento tende a ser mais agressiva em termos de questionamentos sobre decisões que possam, por exemplo, dar frutos com colheitas mais demoradas. O investidor mais interessado na melhor maturidade dos seus investimentos tende a ser um questionador mais preocupado com a sustentabilidade da companhia e, em muitos casos, com as melhores práticas de Governança Corporativa, que depende, e muito, da pressão externa dos acionistas para que seus direitos sejam respeitados e seu patrimônio valorizado, protegido e rentabilizado. Assim, defendo o maior interesse dos acionistas, principalmente os minoritários, nas Assembleias Gerais Ordinarias (AGOs) e no acompanhamento do que acontece de mais relevante na companhia por meio, por exemplo, da página de Relações com os Investidores (RI). Mas vale ressaltar que a companhia precisa estimular este ativismo de forma a conciliar os múltiplos interesses e convergi-los ao interesse maior de sucesso que é o da própria sociedade. Um ativismo participativo e responsável dos acionistas é uma grande ferramenta de fortalecimento da Governança Corporativa nas empresas.

    Um grande abraço,

    Paulo Rogério Lima

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  3. Prezados Wilton e Paulo,

    Agradeço os comentários. O fato é que ainda estamos em um estágio embrionário quando pensamos em atuação de investidores. Quem sabe um dia os investidores institucionais não farão como o CalPERS, que divulga uma lista anual de empresas classificadas como de má governança, ou simplesmente deixarão de investir em empresas que exploram atividades comprovadamente nocivas à saúde humana, como a indústria tabagista.... Um forte abraço.

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