Viva os chatos !!!
Alguns textos deveriam ser de leitura obrigatória nas faculdades
de jornalismo e cursos que tratam de finanças corporativas/governança
corporativa.
Sem uma escrita rebuscada, tão comum em textos teóricos elaborados
por quem vive em uma outra realidade, o craque do jornalismo Fernando Torres
nos apresenta uma interessante reflexão sobre governança corporativa, os papéis
de investidores, empresas, executivos/conselheiros e da nossa querida CVM no combalido
mercado de capitais brasileiro (https://valorinveste.globo.com/blogs/fernando-torres/post/2023/02/boa-governanca-corporativa-depende-do-dono-ou-dos-chatos.ghtml?utm_source=Linkedin&utm_medium=Social&utm_campaign=compartilhar). Trata-se de um texto de 2023, mas bem atual diante do contexto
com fraudes bilionárias e outras orgias societárias/financeiras promovidas por
verdadeiros meliantes fantasiados de acionistas controladores com seus executivos
adestrados (pagamento de bônus para executivos envolvidos em esquemas de
propinas e fechamento de capital a preço vil, por exemplo), além da morosidade
e complacência do Xerife, interessado em arrecadar umas moedinhas com acordos
indecentes.
Soma-se a isso grandes investidores passivos com seus discursos
vazios sobre ESG (não investem em empresas que exploram trabalho infantil e que
fabricam armas, mas investir em empresa corruptora está liberado) e temos um
caldo perfeito para que nada aconteça – putrefação garantida.
Não esqueçamos dos conselhos de administração café-com-leite. Uma
verdadeira confraria de gente educada que adora um chá das 5 e vive viajando
para “conversas com investidores” em Londres e NY. A diversidade passa longe,
com homens sessentões, brancos e barrigudinhos; quando vejo o LinkedIn penso
que se trata do conselho de administração da Smiles ou Multiplus, só acumulando
milhas. Quero ver encarar CEO casca grossa em Montes Claros, terra do ovo frito
no asfalto...
Mas se de um lado temos essa verdadeira horda de investidores
mansos e conselheiros “amigos”, do outro temos o que Fernando Torres chamou de
investidores chatos. O que seria do nosso mercado de capitais sem os chatos?
Confesso que o papel de chato, que busco desempenhar com meia
dúzia de ações de empresas com “desgovernança corporativa”, não é muito
agradável, e por vezes me pergunto se vale a pena comparecer nas burocráticas
assembleias comandadas por advogados famosos que atuam como feitores de fazenda
na Carolina do Sul do século 19, ou denunciar na CVM os executivos da empresa petroquímica
que destruiu bairros de uma grande e bela cidade do Nordeste (faltou
diligência? Ou sobrou ganância?) e a farmacêutica que fraudou contratos para
pagar propina, a mando do controlador malvadão. Vale ressaltar que todos os
acionistas ganham quando um “chato” paralisa uma AGO com questionamentos bem
fundamentados tecnicamente.
Confesso que o número de derrotas é bem maior que o de vitórias, mas
fiquem de olho no processo CVM nº 19957.001121/2025-64 ... (teremos pizza, acarajé
ou multas idênticas ao caso Mariana?).
Um olho no peixe, outro no gato, afinal está liberada a prática de
pagamento de propinas mundo afora (https://www.infomoney.com.br/mundo/trump-suspende-lei-anticorrupcao-de-1977-que-proibe-suborno/).
Mas como diria Suassuna, entre a indignação e a resignação tem a
esperança, um realismo esperançoso, e quanto mais me dizem que sozinho não
posso fazer nada, mais eu quero fazer algo. Se tem bambu, tem flecha.
Abraços fraternos,
Renato Chaves
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