Congresso do IBGC (2ª parte): os números e os fatos comprovam que o conselho fiscal não está em desuso.

Na agitação do Congresso poucos prestam atenção nos “mimos” que são oferecidos pela organização e patrocinadores. Descontem o meu conflito de interesse por participar do projeto, mas gostaria de destacar o livro do Congresso (Discussões sobre os conselhos em empresas no Brasil), organizado pelos professores Ricardo Leal e Joaquim Rubens – vale registrar que a renda com a venda dos livros fica com o nosso querido IBGC.
Pois bem, são 22 textos de qualidade, como o que trata da remuneração de conselheiros de administração em empresas com controle difuso (autoria de Marcos Pinto e do Prof. Ricardo Leal - capítulo 10) e uma bela abordagem sobre secretaria de governança (do amigo Artur Neves – capítulo 7), mas vou usar e abusar da jabuticaba criada pelos amigos Cesar Barreto e Joaquim Rubens (O Conselho Fiscal no contexto brasileiro: uma jabuticaba ou uma solução – capítulo 13) para contrapor a afirmação bombástica feita na 5ª seção do Congresso por um proeminente orador de que o conselho fiscal virou coisa ocasional, que saiu da lupa da CVM !!! Naturalmente o papo do cafezinho voltou ao falso dilema: conselho fiscal ou comitê de auditoria? Qual deles “agrega” mais valor para a Cia.?
Não vou ficar batendo na tecla de que cada órgão atende a um “patrão” distinto, com funções diferentes: o comitê de auditoria é um órgão de assessoramento do conselho de administração e é subordinado a esse órgão. O conselheiro fiscal presta conta aos acionistas da Cia., com ampla, total e irrestrita liberdade para fiscalizar individualmente.
Vou me ater a fatos e os autores do trabalho apresentam números incontestáveis: crescimento de 32% de conselhos instalados entre 2008 e 2009 nas empresas dos segmentos especiais de listagem da Bolsa, sendo que no Novo Mercado o percentual cresceu de 28,3% para 46,5%. Citam ainda estudo da Revista Capital Aberto que, a partir de uma amostra das 80 empresas mais líquidas da Bolsa, revelou que 31 empresas possuem conselho fiscal permanente.  É razoável imaginar que o caráter permanente tem origem no ativismo de investidores e não na vontade de controladores ou mesmo recomendação do regulador.
Mas gostaria de convidar os leitores a visitar alguns processos administrativos sancionadores originados em denúncias formuladas por conselheiros fiscais ao regulador só para reforçar a teoria de que o conselho fiscal aumenta a segurança para os investidores afastados do dia a dia das empresas. Até o nome é apropriado, pois fiscal coloca em alerta qualquer ser humano ajuizado – quem é correto vai organizar a casa para provar que é honesto, e o desonesto vai arrumar um bom advogado para não virar colega do “mequetrefe de Copa” em Bangu 8.
·         Proc. 2005/2734 e 2003/7703 – acesso a informações de empresa controlada;
·         Proc. 2004/5792 – acesso a informações sobre remuneração de administradores;
·         Proc. 39/00 – abuso de controlador;
·         Proc. 2001/12253 – acesso a informações.
Sei que conselheiros de administração são pessoas ocupadas: quando já estão fora da “vida executiva” geralmente ocupam vagas em inúmeros conselhos, alguns em até 7 empresas (é isso mesmo, SETE, não errei a digitação) !!! Quando ainda atuam no mundo empresarial, seja como executivo ou prestador de serviço (consultor, advogado, etc), a carga horária é ainda mais intensa. Sejamos francos: os conselhos de administração no Brasil, raras exceções, não dedicam tempo suficiente para cumprir com suas obrigações. Isso é um sentimento, não dá para medir, fazer pesquisa acadêmica (de forma consciente ou não todos serão tendenciosos nas respostas). Quantos de vocês já não viram conselheiro pedir para ir mais rápido com a apresentação por conta do vôo que ele tem às 16hs (se for o presidente do conselho o pedido é entendido como uma ordem).... Ou ainda mais grave quando solicita a retirada de um item da pauta porque ele não está “confortável” em votar a matéria (esse termo deve ter sido importado do plenário da Câmara...)? Traduzindo: os afazeres profissionais o impediram de ler o material durante a semana e ele dormiu babando nos documentos no domingo à noite, deixando de ver até o show de gols de Seedorf, Bruno Mendes e Cia. Daí a importância dos comitês de assessoramento, para aprofundar a análise, com uma opinião conclusiva.
Ainda foi feita uma “acusação” de que conselheiros fiscais são uns sujeitos céticos, não acreditam em nada que chega dos Administradores.  O fato é que, à exceção da conta “caixa”, todas as linhas das demonstrações financeiras são construídas com complexas interpretações – “impostos a recuperar” suportados por liminares, provisões (sub)constituídas com base em rebuscados pareceres jurídicos, etc. etc.; não é de se estranhar que, apenso às notas explicativas, venha sempre o diretor financeiro iniciando suas respostas com um singelo “veja bem”, o que lembra o comercial de TV onde um enrolado encanador que não usou Tigre tenta explicar ao dono do apartamento porque o encanamento ficou completamente torto. Para entender tem que perguntar, mas as perguntas formuladas por conselheiro fiscal são encaradas pela Administração das Cias. como uma intromissão, uma verdadeira afronta, com raras exceções. Na prática o conselheiro tem que literalmente arrancar as informações da Cia. E aí, aquilo que parece ceticismo, não passa de uma reação. Nada pessoal.
E por último um desafio: quem me apresentar uma denúncia ou uma simples manifestação contrária formulada por membro de comitê de auditoria para um conselho de administração, assembleia de acionista ou até mesmo para a CVM, ganha uma garrafa do encorpado vinho tinto Prestigio, da bodega espanhola Matarromera. Mas não vale parecer de comitê de banco quebrado e o documento tem que ser público....
Abraços a todos e uma boa semana,
Renato Chaves

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