Já surrupiaram muito dinheiro dos fundos de pensão.... Agora querem tungar o direito de voto.

Situações onde quadrilhas (ou bandos na forma do Art. 288 do Código Penal) operam de forma escancarada no mercado financeiro atacando como ratazanas os recursos dos fundos de pensão infelizmente são frequentes (vide jornal Valor da última 5ª feira). Normalmente são operações com contratos futuros, onde as pontas ganhadoras (geralmente um grupo muito restrito de clientes de uma mesma corretora) “acertam” de forma profética 90%, até 95% das operações, tendo como contraparte fundos de investimento exclusivos das fundações (assim fica mais fácil esconder o rombo). Os modelos de controle foram aperfeiçoados, mas o fato é que o site da CVM tem vários exemplos desse “modus operandi” (dia 7/8 foi julgado um desses, dessa vez sem “termim” de compromisso para engavetar o processo...).
Isso é o varejinho, operações que rendem alguns milhões para as quadrilhas. Outros bandos, menos truculentos no agir e mais “eficientes” no resultado final (foram “negócios” de bilhões de reais), optavam por operações mais sofisticadas, de difícil questionamento, pois a compra de “micos” era vista somente como um conjunto de insucessos de gestores letrados, com boa formação acadêmica: foram terrenos para construção de hotéis em praias cheias de pedras (esse caso teve até o “Toninho Malvadeza” como testemunha no cartório!!!), porto com pedra gigante submersa no meio do canal de atracação, sócio minoritário de edifício garagem (o famoso minorotário – minoritário + otário), hospital paulista em estado terminal, vários parques de diversões (mergulhados em piscinas de ondas e dívidas), prédio na Bandeirantes para salvar supermercado quebrado, participação acionária em fabricante de azulejos/pisos cerâmicos em dificuldades financeiras eternas, participação em leilões de privatização nas chamadas operações “cerveja caracu” (termo cunhado por um ilustre advogado carioca), participação minoritária em shoppings sem direito a sequer ver os balanços (operação “casa de praia” – traz somente duas alegrias - uma na compra e outra na venda), etc., etc.... A criatividade era enorme, sempre com a assessoria de criativos e bem remunerados bancos de investimento e renomados advogados, igualmente bem remunerados (no estilo taxímetro na bandeira 2). Muitos mamaram nas tetas e tem dirigente de fundo de pensão que até hoje vive em mansão nobre na Barra de propriedade de uma empresa sediada em paraíso fiscal. Pode Ronaldo (irmão do Arnaldo que entende tudo de mercado de capitais)?
Feito este pequeno introito vamos ao principal: o movimento indignado, originado em uma assembleia de uma importante empresa brasileira, que questiona o voto dos fundos de pensão, mais especificamente daqueles que tem como patrocinadoras empresas públicas/economia mista, que são as 3 maiores fundações do Brasil.
Primeiramente, não há que se discutir a quem pertence os recursos dos fundos de pensão: todas as contribuições, das patrocinadoras e dos associados (são alguns milhões de CPFs), são depositadas na conta corrente de uma entidade com CNPJ próprio e passam a fazer parte de uma grande “bolo”, que será investido ao longo de anos e anos para suportar o pagamento dos benefícios futuros. Quem fala que fundo de pensão depende financeiramente da patrocinadora entende tanto de fundo de pensão como eu entendo da distribuição de neutrinos na estratosfera, ou seja, bulhufas. O modelo de governança nesse tipo de entidade está consolidado, com órgãos deliberativos e de fiscalização compartilhados entre dirigentes indicados pelas patrocinadoras e eleitos pelos associados, que irão monitorar a gestão. Se existe alguma pressão de um lado, por maiores benefícios para os associados por exemplo, o “outro” lado está ali para “equilibrar” a balança e barrar decisões que possam comprometer o futuro da entidade. E isso vale para os dois lados. Mas sempre é bom lembrar que, em um passado não muito distante (Mourisco, junho de 2002), esse frágil equilíbrio foi rompido por meio de uma truculenta intervenção, com cassação de mandatos, etc., etc.
Pois bem, os “indignados” afirmam que os fundos sofrem pressão para fazer a vontade do Governo: seriam assim minoritários com voto “viciado”, “defeituoso” ou “contaminado” (termos “roubados” de sábios advogados), pejorativamente conhecido como voto “chapa branca”, e que por isso deveriam ser impedidos de votar em assembleias de empresas estatais. Ou seja, estaria consolidada a teoria do conflito de interesses ex-ante, onde o candidato de um grupo de investidores nasce como não confiável, suspeito, tendencioso, acomunado com o “lado negro da força”, mesmo que seja um ex-diretor da CVM ou um monge tibetano do mosteiro de Kirti (pelo Tibete Livre !!!).
Não vou entrar no mérito sobre a assembleia em si, pois não participei e não sei dos detalhes sobre o lado “operacional” do encontro - quem apresentou os candidatos, quem votou em quem, etc. Tenho a certeza que a CVM terá todos os elementos para avaliar a situação melhor do que qualquer palpiteiro de plantão.
O ponto é o questionamento sobre o direito de votar desses investidores quando a empresa investida é controlada pelo Estado. Prevalecendo a tese dos “revoltosos”, as fundações estariam impedidas de votar nas assembleias da Eletrobras, Banco do Brasil e Petrobras, por exemplo. E por que não, considerando que relações políticas são que nem água morro abaixo, nas assembleias da Cemig, Copel, Celesc, Sabesp, Sanepar, Banrisul, etc.? Pode votar nas empresas onde o banco de desenvolvimento estatal detém participação relevante Ronaldo (mais uma centena de empresas)? Lógico que não, responderão os “fundamentalistas”, pois o governo é controlador do banco, os ministérios se acertam e a turma das fundações é pau-mandada do governo. Vale frisar que a legislação permite que as fundações detenham ações das respectivas empresas patrocinadoras e também impõe regras claras sobre o dever fiduciário dos gestores das fundações. Assim, o direito de voto sempre deverá ser exercido, inclusive com divulgação para os associados. Sendo mais claro: o dirigente de fundação que não exercer um direito, seja ele qual for, poderá ser processado por iniciativa de qualquer um dos milhares de associados da fundação. Não é como nas nossas sociedades anônimas, onde é preciso juntar 5% do capital social em situações extremas.
Mais uma vez sem entrar no mérito do caso concreto, é natural e legítimo que esses gestores conversem para votar em candidatos que se identifiquem com a linha de pensamento das fundações. Avalio que nessa categoria certamente não se enquadra um candidato com a “cabeça” de gestor de fundo de hedge, por exemplo. Enquanto as fundações têm a “paciência” para ficar com o ativo na carteira por concordar com estratégias de médio/longo prazo, os fundos “ariscos” tendem a investir hoje e vender depois de amanhã. E podem estar “vendidos”, “comprados” ou “alugados” sem ninguém saber.
É bom frisar que não existe um candidato mais capaz, honesto ou comprometido do que outro, pois no frigir dos ovos todo conselheiro eleito deve lealdade à Cia., conforme reza a Lei e o Código de Melhores Práticas do nosso querido IBGC (Em tempo: as inscrições para o Congresso em outubro estão abertas...).
Não escrevo como um teórico ou acadêmico que nunca pisou em uma assembleia ou em um conselho de administração/fiscal (e os cabelos brancos de quase 47 anos de praia ajudam nessa hora...). A fundação onde atuei como dirigente sempre votou na assembleia do patrocinador para eleição de conselheiros. O nome que apresentávamos era sempre de uma pessoa impoluta, detentora de notório saber e reconhecida pelo mercado. Ou será que alguém duvida da independência de um ex-diretor da CVM? E tem mais: adotávamos a orientação apresentada no sábio voto do diretor-relator do processo CVM nº 07/05 (julgado em 24/4/2007), fazendo com que os gestores indicados pela patrocinadora não participassem do processo de decisão na escolha do nome do futuro candidato. Nunca tivemos problema.
Quem adquire uma ação passa a ter determinados direitos (e deveres também). Como em processos de eleição de conselheiros os candidatos são extremamente competentes e íntegros, deve prevalecer a lógica do mercado, que é simples e cruel: o grupo que tem mais ações ganha. Quem não gosta da estratégia da Cia. vende o papel e compra outro. Opções não faltam.
Por fim, depois de uma corridinha inspiradora na incrível orla de Copa, fico imaginando se alguém vai ter a cara de pau de sugerir que as fundações entreguem a gestão de suas carteiras de ações para os BRAs ou Is da vida como solução salvadora para essa questão. Prática comum no exterior, comentários ouvidos dos colegas dessas fundações dão conta que as milionárias taxas de administração pagas não guardam muita relação com retornos para os fundos de pensão: cobra-se muito e entrega-se pouco, normalmente rentabilidade idêntica a de índices de mercado. E por falar nos BRAs/Is da vida, com os seus jingles irritantes e suas teias de interesses comerciais, os bancões sempre fazem com que os fundos de investimentos que administram votem em estranha sintonia com controladores/administradores das empresas, muitas vezes contra acionistas minoritários. Pode Ronaldo? Será que existe algum conflito de interesse no voto, por conta das intensas relações comerciais entre as partes? Se proibirem os fundos de pensão de votar nas assembleias de “estatais” sugiro que a nova regra seja expandida para impedir o voto das instituições financeiras em TODAS as empresas onde exista relacionamento comercial.... E que tal restringir o voto do banco que coordenou uma recente oferta pública na empresa? Não pensem que é invenção, devaneio de um alvinegro que aguarda a comemoração de um milésimo gol ou alarmismo de um gestor ressabiado com banqueiro baiano e outros criativos controladores do fétido Polo de Camaçari: foi assim por anos na empresa que matava frango e achava que era banco (e quebrou), naquela que vende produtos cancerígenos/fedorentos (vão dizer que sou implicante...) e em tantas outras. Mas nessa hora nenhum valente aparece para gritar.
Abraços a todos,
Renato Chaves

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